domingo, 30 de janeiro de 2011

As minhas flores.


Não te amo, quero-te. Quero-te como quero cuidar das rosas vermelhas do meu jardim; com todo o carinho e amor. Regarte-ia todos os dias com o meu jarro amarelo, podava-te sempre que chamasses por mim. Esperaria o máximo até te cortar pela raiz, de modo a que voltasses a crescer, à velocidade dos dias e com as tardes solarengas.
Juntaria ao teu canteiro outras belas flores, para que a solidão não se apoderasse de ti. Talvez lírios ou estrelícias, bem sei que gostas de flores coloridas.
Eras a flor mais bela do meu jardim.

A Quinta.


A poeira circulava feita em rolos, que aumentavam à medida que giravam, devido ao vento.
A areia cercava o terreno dele, como se fosse uma vedação, para tornar a sua propriedade ainda mais privada.
A quinta, essa sim, era coberta de musgo e plantas trepadeiras que rodeavam as paredes, as janelas eram tapadas por portadas velhas com bastante falhas, deixando entrar o calor abafado.
O tempo que preenchia a paisagem era quase sempre idêntico: quente demais para se viver.
Lá na quinta vivia ele com a sua gata castanha, demasiado velha para sair do cesto encostado à lareira, apagada á anos.
Durante os dias ele, deixando a gata nas suas sete quintas, ultrapassava a vedação de areia e corria ao sabor do vento, querendo manter o seu físico em forma. O exercício ocupava quase todo o seu dia, voltando à quinta apenas para almoçar e para se refrescar, não aguentando o calor.
O seu mundo criou-se apenas entre a quinta, a vedação de areia e a área onde ele corria. Nem a gata o irá salvar.
Ele tem a plena consciência de que, mais cedo ou mais tarde, na sua solitária quinta, com a sua gata, encostados à lareira apagada, rodeados do calor ofegante, irá morrer.

Sala de aula

Ela estava sentada na cadeira do fundo, encostada à parede. Sentia-a ausente; distante. A Dona Inácia chamava-a a atenção constantemente, para ela se endireitar e se concentrar, embora o seu corpo não permitisse que ela coubesse na pequena cadeira de madeira.
Chovia bastante lá fora. A temperatura da sala deveria apenas atingir os dez graus, de modo que todos estavam encolhidos e cobertos de casacos. Até a Dona Inácia, que é uma mulher calorenta, de dois em dois minutos dava aquele berro a repontar com o frio, sempre que se chegava perto da janela.
A rapariguinha lá continuava, quieta e serena, com os seus pensamentos, no seu mundo. Com o seu cabelo encaracolado e pouco penteado, lá o endireitava para não ultrapassar a lente dos óculos. Tinha um aspecto solitário, a coitada da menina.
A Dona Inácia e a rapariga do fundo da sala eram mãe e filha.